quarta-feira, 1 de abril de 2015

XII- Choro

Um rapaz de dezesseis, quase dezessete anos conversa sobre praticamente toda sua história de família. Ao comentar sobre o pai, separado da mãe e que vive em outro estado, ele me disse: “eu não tenho frescura, se eu tiver que chorar eu choro mesmo, foda-se. Sou diferente da minha irmã, que prefere não demonstrar isso”. A fala dele me mostra que algo avançou neste sentido, mas em pleno 2015 ainda há resistências ao choro. Comigo não é diferente.

Sempre fui o tipo da criança bobona, do tipo que “só tinha tamanho”. A dor sempre foi muito forte pra mim e creio que, na verdade, sempre tive medo de senti-la. Esse medo por exemplo deve ser a razão pelo não me lembrar de muitos dos meus choros por tristeza ao longo da minha vida.

Por outro lado tem a repressão ao meu chorar. Muitas vezes já me vi em situações em que eu não dispunha de recursos para enfrentá-la, por reprimir minha raiva e chorar ser o último recurso. E ele era devidamente repreendido. Existem duas situações do meu passado que podem ilustrar bem como isso aconteceu.

A primeira foi na praça em frente ao prédio que eu morava. Havia um garoto que cismava comigo, provavelmente porque ele tinha ciúmes da amizade que eu tinha com outro rapaz, poucos anos mais velho e daí ele começou a implicar, fazer o que hoje chamamos bullying e não satisfeito, corria para longe, onde ele pegava os oitis do chão para tacar em mim à distância. E corria para eu não pegá-lo.
Talvez ele conhecesse a minha capacidade de ser agregador, político e colocou o grupo dos garotos contra mim. Eu, sem recursos, o xinguei, corri para casa e chorei. E fui devidamente repreendido pela minha mãe por não ter sido “homem” e não partir para a briga.

Essa mesma repreensão apareceu depois quando poucos anos depois fui suspenso no colégio por uma gracinha que escrevi no quadro contra um professor bizarro de geografia. Na verdade foi uma suspensão em que 10 garotos foram parar na sala da direção. Tomei um esporro pelo fato de eu ter me entregue junto com os demais para o diretor. Fui acusado de “otário” (uma das palavras que mais detesto) por não ter ficado na minha. E daí comecei a chorar, por me sentir incapaz. Por outro lado isso fortaleceu meus laços com aqueles garotos da sala, já que eu era o CDF que sentava com a “turma do fundão”.

Percebo que choro também em momentos de alegria. Geralmente eles se dão quando estou escutando música, muito comum quando estou viajando de ônibus. Eu me lembro de que após uma crise amorosa profunda, comecei a notar que as músicas da minha playlist falavam sobre o que eu estava sentindo, o que passei e como aquela situação poderia ser superada. Daí essa percepção me tornou alegre, por perceber que no meio daquele turbilhão em mim havia qualidades que me fariam sair daquela situação. E consegui.

Mas não preciso realmente de um motivo específico para chorar ouvindo música. Basta eu perceber a beleza que existe nela, se ela de alguma forma me emociona, mesmo que eu não consigo encontrar as palavras certas para definir que eu sinto.


Por isso deve ser o meu choro uma forma de comunicação, sobretudo. De algo que muitas vezes está em mim e que não consigo nomear. O choro é o que escapa do muro da repressão. E, quem sabe um dia, eu terei a mesma coragem em admiti-lo como o rapaz de dezesseis, quase dezessete anos.


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