quinta-feira, 2 de abril de 2015

XIII- Humildade

As poucas semanas anteriores ao meu aniversário, em geral, são atravessadas pela semana santa. Para mim ela tem sentido (ou tinha) a partir da quinta-feira. 

Em um dia como hoje me lembro do padre repetindo, na missa das crianças, o gesto de Jesus com os apóstolos, no qual ele lava os pés de cada um deles. Então o simbólico do dia de hoje é a humildade: o deus cristão humanizado lavando os pés de seus apóstolos.

Minha formação católica passa por essa palavra. Certa vez, um garoto que estudava comigo e era meu vizinho quis me desmerecer de alguma forma. Minha mãe, preocupada, resolveu conversar com a freira que era uma das coordenadoras do colégio a respeito. A freira disse: pode deixar que vou conversar com ele.

Antes da tal conversa, um conselho materno: ela vai falar de humildade. Não seja "humilde". Ela vai usar isso como forma de querer parecer boazinha, mas no fundo vai querer rebaixar você e, de certa maneira querer que você se conforme com as coisas tais como elas são. E ela estava certa: a freira tentou esse discurso comigo, mas não dei trela ao que ela disse. Ainda bem.

Eis uma das minhas birras com certos sistemas e nesse sentido o catolicismo não escapa. E olha que eu estava em uma escola relativamente progressista, toda trabalhada na Teologia da Libertação típica dos anos 80. Ainda assim, com esse discurso de que existem divisões de classe do Santo Marx, havia com ele uma fala de conformidade pela "humildade". E sorte a minha ter, nesse caso, uma mãe atenta a isso.

Não que eu veja a humildade em si como defeito. Tenho pavor de arrogância por exemplo, porque sou capaz de reconhecer que esse é um dos meus piores defeitos. Todavia, percebo o quanto essa palavra é usada como forma de manipular ou ao mesmo tempo dar um ar de santidade a quem se afirma dessa maneira. Isso está incrustado na nossa cultura.

E esse episódio da freira me faz pensar numa frase dita por uma militante feminista negra: "antes de ser de esquerda ou de direita eu sou negra". Pensar nisso é bom, quando ambos os espectros políticos usam isso para manter certas coisas no "status quo". Deixar tudo do jeito que está, mas na "humildade", como costumam dizer os jogadores de futebol.





Nenhum comentário:

Postar um comentário